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Tratando Segurança "pelas bordas"

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Artigos de opinião

* Valdênia Brito e Juliana Cesar


O Brasil vive mais um momento de comoção social diante do aumento da criminalidade. O tema vem dominando a mídia, sucessivamente alimentada com casos de grave repercussão, como os assassinatos dos Prefeitos de Campinas e de Santo André, os seqüestros de empresários de renome e a sempre pungente atuação do Primeiro Comando da Capital (PCC). A sensação de insegurança e de verdadeiro caos social se expressa na urgência com a qual se cogitam propostas de maior repressão ao crime, mesmo que para isso sejam suprimidos e/ou restringidos direitos e garantias individuais.


Esse é um fenômeno notoriamente cíclico. E o ciclo é vicioso. Os exemplos já não precisam ser buscados num passado distante. Quem não lembra do lançamento do Plano Nacional de Segurança Pública, feito logo após a crise gerada pela morte de uma refém num incidente em um ônibus no Rio de Janeiro?


De qualquer modo, não se pode dizer que não houve investimentos em segurança pública nos últimos dois anos. Entretanto, se antes os maiores problemas eram o descaso do Governo e uma conseqüente ausência de recursos destinados à área, hoje a questão se centra no acerto das escolhas feitas no sentido de coibir a criminalidade, que cada vez se apresenta mais cruel. Deve-se questionar se ações empreendidas são efetivamente preventivas ou meramente paliativas.


Uma “boa ação” é valorizar a capacitação da Polícia. Em um período de tempo relativamente curto, conseguiu-se conscientizar tanto Governo quanto sociedade de que é imprescindível dotar o corpo policial de mais recursos para o combate ao crime; seja na formação pessoal, ao permitir que o policial conheça seus direitos e deveres (assim como os daqueles que deve defender), seja no provimento técnico de instrumentos como planejamento estratégico e bancos de dados especializados sobre violência.


Contudo, peca-se no Brasil porque se concebe a Polícia como a única responsável pelo controle da criminalidade no país. A repressão do crime organizado pressupõe a integração de diversos órgãos, sob pena de estar, desde o início, condenada ao fracasso. Hoje, há, na verdade, uma inversão de políticas: é o crime que se organiza, planeja, intercambia informações e executa com sucesso ações ousadas, que acabam por atentar contra os direitos fundamentais de toda a população.


Outro ponto a se ressaltar é a dissociação entre violência e concentração de renda no Brasil. Muitas vezes, quando se pensa sobre violência, se ignoram as distorções sócio-econômicas provocadas pela concentração de renda no País, as quais em muito contribuem para o recrudescimento observado nos últimos anos.


Por fim, pensar segurança “pelas bordas”, ou seja, através de “pseudo-soluções” que apenas driblam o problema e enfatizam os esforços em ações sutis que tão-somente suprimem normas fundamentais. Isto não afeta o rumo brasileiro a um “Colombian way of life”, que cada vez mais (guardadas as devidas hipérboles) se afigura nas perspectivas nacionais. Repetir erros do passado com medidas paliativas e de vã (in)eficácia não parece a ação a ser esperada de um país que pretende se orgulhar de um avanço socioeconômico eficiente, justo e determinado.

* Valdênia Brito e Juliana Cesar são da Equipe de Monitoramento do Sistema de Justiça e Segurança do Gajop - Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares





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