Documento homenageia o coordenador do Projeto Saúde e Alegria, Paulo Henrique Lima (in memoriam), e destaca elementos necessários para promover a inclusão digital no país. Lançamento foi realizado em Brasília, no Distrito Federal, durante a 14ª Oficina de Inclusão Digital, em 19-10-2023. Fonte: Projeto Saúde e Alegria. A Carta está em anexo em PDF.
Texto publicado em 20-10-2023.
Defensor da inclusão digital como um direito humano, Paulo Lima acumulou uma trajetória de luta pelo acesso à internet em regiões isoladas da floresta. Plima, como era carinhosamente chamado, chegou à Amazônia em meados dos anos 2000, com o desejo de contribuir para melhorar a vida de populações ribeirinhas. Era um sonho particular, poder ajudar a diminuir as desigualdades sociais. Do campo da Inclusão Digital desde o fim da década de 1980, passou pelo Ibase/Alternex, Secretaria Executiva da Rede de Informações para o Terceiro Setor (RITS) e, desde 2007 atuava na Coordenação de Inclusão Digital do Projeto Saúde e Alegria.
Paulo Lima estava articulando com outras lideranças a retomada das Oficinas de Inclusão Digital e Participação Social após sete sem a realização do evento, em um contexto dificil para a sociedade brasileira. Não conseguiu ver a oficina acontecer, mas estava presente. A 14ª Edição prestou uma homenagem com o nome da carta. “Foi uma emoção muito grande essa retomada que a gente fez. E não vamos parar, vai ter oficina todo o ano!, contou Beatriz Tibiriçá, do Coletivo Digital, uma das ONGs promotoras do evento.
A Carta ressalta a importância da retomada das políticas públicas de inclusão digital no país, dos telecentros, dos direitos digitais como o letramento digital e do livre acesso à internet, do software livre, das redes comunitárias como forma de combater a desinformação e de fortalecer a autonomia das tecnologias e gestão comunitária, das estratégias de segurança de dados, da soberania digital e ancestral. O documento, que conta com a adesão de dezenas de institutos, coletivos, associações, organizações governamentais e redes, será encaminhado para toda a administração pública e ficará disponível, no site do evento, para novas assinaturas.
“É a retomada de um processo que havia sido parado há 7 anos por conta dos desmontes das políticas sociais e de inclusão. Estamos retomando esse processo e colocando a pauta da inclusão digital no processo de reconstrução do país. Nós vivemos numa sociedade de informação e conhecimento e quem não tem acesso adequado a essas tecnologias também está mais excluído socialmente. Nós do PSA sempre batalhamos por essa pauta e viemos trazer o nosso ponto de vista, o nosso reforço a essa agenda”, contou um dos coordenadores do PSA, Fábio Pena.
O encontro contou com o apoio institucional de órgãos e entidades do governo e sociedade civil como o Sesi, Serpro, Dataprev, Comitê Gestor da Internet e Projeto Saúde e Alegria. Na cerimônia de encerramento também foi anunciado o retorno do Fórum Internacional do Software Livre (FISL), com previsão para julho de 2024, abrigando uma nova oficina de inclusão digital.
“Nesta Carta que contém contribuições do próprio Paulo, tivemos a oportunidade de incluir ainda neste documento, temáticas de incentivo às pautas de gênero, infraestrutura de cuidados e meio ambiente, fomento das redes sociodigitais, justiça climática sobre os princípios da circularidade contemplando a realidade da Amazônia. Esse foi um momento histórico depois de sete anos a gente retorna a Brasília para reunir figuras importantes da cultura digital interagindo com uma atual geração sob novos olhares, inclusive, a partir dos princípios colaborativos do Software livre”, contou a pesquisadora da Escola de Redes, Adriane Gama.
Escola de Redes Comunitárias da Amazônia
Pilar de formação e treinamento do projeto “Conectando os Desconectados”, uma iniciativa global, promovida pelas organizações APC e Rhizomatica e executada no Brasil pelo Projeto Saúde e Alegria, a escola é um legado de Paulo Lima (in memoriam), cuja atuação incansável buscou conectar comunidades desconectadas por meio do desenvolvimento de modelos, capacidades e formas de sustentabilidade para populações com foco em assistência técnica, capacitação, assessoria para advocacy e mobilização comunitária.
Em 2021, um conselho consultivo foi formado para discutir as metodologias e áreas temáticas para as ações da escola. O grupo de especialistas é composto por Beatriz Tibiriçá (Coordenadora Geral, Coletivo Digital), Georgia Nicolau (Diretora de Projetos e Parcerias Pró Comum), Jader Gama (Pesquisador – UFPA), Doriedson Almeida (Professor – UFOPA), Karina Yamamoto (Pesquisadora – USP e Jeduca), Guilherme Gitahy de Figueiredo (Profº UEA – Tefé – AM) e Carlos Afonso (Diretor Executivo – Instituto NUPEF).
A primeira turma da escola contou com a participação de 21 alunos em três estados da Amazônia Legal (Acre, Amazonas e Pará). As comunidades que possuíam integrantes na formação foram: no Pará, os projetos Ciência Cidadã na Aldeia Solimões e Guardiöes do Bem Viver no PAE Lago Grande – ambos no município de Santarém – e a Rede Águas do Cuidar/ Casa Preta na Ilha de Caratateua, grande Belém. No estado do Amazonas, a Aldeia Marajaí, município de Alvarães – Médio Solimões; o Grupo Formigueiro de Vila de Lindóia em Itacoatiara; e a Rede Wayuri em São Gabriel da Cachoeira. No Acre, a Aldeia Puyanawa em Mâncio Lima.
“Nós somos os realizadores de coisas impossíveis. Por exemplo, a Escola de Redes Comunitárias da Amazônia, da qual eu sou conselheira também, fez e aconteceu. Nós juntamos todos os fazedores e montamos a 14ª Oficina de Inclusão Digital e Participação Social que acabou de aprovar a carta Paulo Lima de Inclusão Digital e Participação Social. Carta ao povo brasileiro. Isso é uma emoção muito grande, inclusive que o Paulo Lima participou da escrita desses documentos que nós usamos para compartilhar com todo mundo na oficina. Ele esteve o tempo todo conosco. Toda a Amazônia estava aqui”, ressaltou Beá Tibiriçá.
Inclusão Digital como legado de Pima para a Amazônia
“Em nossa região implantamos cerca de 40 Telecentros Culturais (desde 2001, quando estava ainda na Rits) e hoje atuamos regionalmente com o Projeto da Escola de Redes Comunitárias da Amazônia, com 7 organizações do Acre, Pará e Amazonas. Estamos também coordenando ações de Telemedicina nos municípios de Santarém, Aveiro e Belterra. Temos muito interesse em contribuir no Conselho do FUST que vimos nascer lá em 2000 e que tanto lutamos para que fosse enfim aplicado para o que foi pensado”, escreveu o próprio, menos de uma semana antes de falecer.
Paulo Lima, historiador e Mestre em Recursos Naturais da Amazônia, era um apaixonado pela arte de ensinar. Atuava há treze anos como professor no Iespes, onde lecionava para os cursos de direito e jornalismo. Paulo, que foi consultor da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), era também especialista em avaliação e gestão de projetos sociais. Com experiência na área de História, Sociologia Rural, Ciências Ambientais, Ciência Política, Redes Comunitárias e Comunicação Social, atuava com comunidades tradicionais, Amazônia, sociedade da informação, comunicação alternativa, história, sociedade civil e movimentos sociais.
Estava animado com um novo projeto de inclusão digital que havia iniciado recentemente, o Conexão dos Povos da Floresta, dos Mundurukus ao baixo Tapajós, que levaria conexão de internet para populações indígenas e ribeirinhas da floresta. Dias antes de partir, havia realizado testes com as primeiras antenas e muito entusiasmado, chamou a equipe do Projeto de Redes Comunitários, a qual coordenava para compartilhar o sucesso da experiência.
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