Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Novidades do Terceiro Setor
10 DE MAIO DE 2005
Nós, profissionais e ativistas, atuando em organizações governamentais, não-governamentais e organismos internacionais, e representantes de grupos, iniciativas e associações comunitárias, de moradores e de mulheres, reunidos no Teatro João Caetano no Rio de Janeiro em 10 de maio de 2005, afirmamos publicamente o compromisso pela produção de uma sociedade mais saudável, justa e eqüitativa. Compromisso este que implica necessariamente em atenção especial para a melhoria das condições de vida e saúde da população moradora em favelas e bairros de periferia dos centros urbanos do estado do Rio de Janeiro.
Declaramos apoio e participação ativa como membros ou parceiros nas ações propostas pela REDE DE COMUNIDADES SAUDÁVEIS DO RIO DE JANEIRO. Entendemos ser este um movimento da sociedade civil, nos moldes preconizados pela Organização Mundial de Saúde quando considera que a comunidade saudável é aquela em que seus governantes formulam políticas públicas integradas, promotoras de saúde e com plena participação comunitária. Esta REDE traz a sociedade civil organizada para o centro do movimento de comunidades e cidades saudáveis, e preconiza como diretriz principal à atuação de organizações comunitárias de base na gestão local, frente aos problemas sociais que afetam a qualidade de vida., contribuindo efetivamente para a promoção da saúde.
Reconhecemos que:
· No interior de favelas e conjuntos habitacionais da periferia dos centros urbanos do estado do Rio de Janeiro, há um grande número de mulheres e homens que dedicam suas vidas à causa comunitária, implementando valiosas ações cotidianas de apoio social, prevenção e promoção da saúde;
· Este trabalho, em sua maioria, é voluntário, e requer grandes esforços individuais e coletivos para o enfrentamento dos desafios diários e de busca de soluções, sem que seja devidamente reconhecido pelo poder público e pela sociedade de modo geral;
· Como na maioria dos grandes centros urbanos brasileiros, a vida nas favelas cariocas torna-se cada vez mais complexa e frágil, submetida a episódios diários de violência em suas diferentes manifestações: desde a segregação imposta pela sociedade, aos riscos representados pela constante guerra travada entre os comandos do crime organizado e pelo próprio aparelho de segurança do Estado com sua ação quase que exclusivamente repressiva e violenta;.
· No interior das favelas e bairros de periferia, a população convive diariamente com episódios de dor, tristeza, doença, mas também de alegria, saúde e solidariedade, a partir de cada ação comunitária realizada. Estas devem e podem ser reconhecidas, valorizadas e fortalecidas, em nome da defesa e do direito à vida, fundamental para todos nós.
Nos comprometemos a:
· Continuar diariamente produzindo saúde no interior das comunidades, implementando ações locais de informação, reflexão e articulação voltadas para o enfrentamento dos diferentes problemas e determinantes sociais que afetam a saúde da população;
· Trabalhar pelo cumprimento dos direitos e deveres de cada cidadão brasileiro, entre eles o direito à saúde e à vida; pela igualdade no usufruto destes direitos e no acesso a oportunidades, sem distinção de cor, gênero, classe social, idade, religião ou orientação sexual - princípios básicos da democracia;
· Promover o diálogo e a solidariedade entre as famílias, trabalhando por uma sociedade de paz, permeada pelo afeto nas relações sociais.
Repudiamos:
· A discriminação e a segregação social imposta a moradores de favelas e bairros de periferia;
· Todas as formas de violação aos direitos humanos e de violência.
· Os limites de circulação espacial impostos pelo crime organizado;
· A utilização das ações produzidas pelas e nas comunidades, para fins eleitoreiros; o clientelismo e o patrimonialismo de muitos políticos, e a decisão sobre alocação de recursos públicos baseada em critérios unicamente eleitorais.
Exigimos:
· O reconhecimento de comunidades populares como lugar de vida de cidadãos brasileiros, com direitos a serem respeitados;
· Atenção e respeito do poder público, imprensa e a sociedade em geral, em relação ao trabalho implementado por lideranças e moradores nas comunidades;
· Que os espaços de diálogo entre as necessidades e demandas da população em relação ao governo sejam abertos e facilitados;
· Que as decisões sobre políticas públicas sejam efetuadas com a plena participação das comunidades, consolidando e aperfeiçoando os espaços de diálogo e pactuação entre Estado e Sociedade Civil;
· Que seja apresentada uma prestação de contas mais transparente e direta do governo para a sociedade civil, no que se refere à alocação de recursos públicos;
· Que sejam facilitados os canais de diálogo entre a sociedade civil e os órgãos reguladores dos direitos sociais;
· Que os direitos à saúde garantidos por lei sejam integralmente cumpridos;
· Que programas de saúde, educação e outros dirigidos a comunidades populares sejam devidamente valorizados e ofereçam serviços de qualidade;
· Que profissionais e servidores públicos responsáveis pela execução das ações sociais nas comunidades valorizem a participação comunitária no planejamento, execução e avaliação de suas ações, reconhecendo a liderança/gestor comunitário como um agente ativo e um ator importante para a articulação intersetorial de políticas públicas no território.
Propomos:
· O fortalecimento da REDE DE COMUNIDADES SAUDÁVEIS DO RIO DE JANEIRO, para que sejam consolidadas e articuladas entre si as diferentes iniciativas voltadas a melhoria das condições de vida em cada favela ou bairro de periferia do estado do Rio de Janeiro;
· Que os membros da Rede possam continuar implementando e aperfeiçoando seu trabalho social, de modo integrado e articulado, com acesso a recursos financeiros e técnicos adicionais, aplicados de acordo com metas e objetivos pactuados com os moradores, conhecedores da realidade e cultura local;
· Que sejam criados desde já espaços de diálogo entre a Rede e os diversos níveis de governo e o setor privado.
Os pontos de consenso para o trabalho da Rede de Comunidades Saudáveis são:
· Que seja garantido o direito a moradia;
· Que sejam viabilizadas condições para que todos os moradores possam ter acesso aos documentos básicos para exercício da cidadania;
· Que haja respeito e seja estimulada a solidariedade entre todos os grupos sociais em cada comunidade;
· Que todas as crianças estejam matriculadas em instituição pública de educação;
· Que haja atenção especial para as necessidades de alimentação, proteção e cuidado de crianças e idosos;
· Que seja utilizado o potencial de participação e apoio social de centros e grupos religiosos em suas diferentes doutrinas;
· Que sejam garantidas as expressões artísticas e de opinião de todos os moradores através de órgãos de mídia comunitária como rádios, jornais e televisões;
· Que sejam viabilizadas condições para fortalecimento das iniciativas comunitárias já existentes em cada comunidade, e a criação de outras segundo demandas, interesses e cultura local;
· Que sejam garantidos o direito a cultura, ao lazer e à recreação a crianças, adolescentes, adultos e idosos moradores nas comunidades;
· Que sejam ampliadas as ofertas de trabalho e renda;
· Que lideranças, gestores, conselheiros e agentes comunitários, que trabalham em prol da saúde e do desenvolvimento da comunidade, sejam permanentemente capacitados para atuação dentro dos princípios da democracia, da negociação política e dos direitos humanos.
· Que sejam implementadas ações para enfrentamento de situações de risco que favoreçam o surgimento das doenças infecciosas e crônicas que representam os principais agravos à saúde nas comunidades,
· Que as lideranças comunitárias e moradores participem ativamente do processo de formulação e cumprimento de leis e políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de vida de comunidades populares.
Temos a certeza de que o trabalho da Rede de Comunidades Saudáveis do Rio de Janeiro terá como resultado a melhoria das condições de vida de seus moradores, parcela expressiva da sociedade brasileira. Assinamos, portanto, este documento expressando nosso apoio a esta iniciativa, nosso compromisso de contribuir para levá-la adiante e nossa esperança na busca de cidades mais justas, eqüitativas, integradas e saudáveis.
Princípios elaborados a partir de indicações, sugestões e expectativas de 60 associações comunitárias (listagem disponível) durante o processo de capacitação e organização da REDE realizado pela organização da sociedade civil Centro de Promoção da Saúde – Cedaps. Este grupo é considerado um conselho FUNDADOR da REDE. Foram ainda, apresentados ao conjunto de entidades parceiras presentes ao dia do ato público em que será divulgada esta declaração.
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