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Carta da ABIA em repúdio à censura da campanha sobre prostituição e HIV/AIDS pelo Ministério da Saúde

A ABIA - Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS, organização fundada pelo sociólogo Betinho ainda em 1987, vem acompanhando e se posicionando publicamente, desde 4 de junho de 2013, quando foi anunciada pelo Ministro da Saúde a censura à campanha sobre prostituição e HIV/AIDS lançada por ocasião do Dia Internacional das Prostitutas, celebrado em 2 de junho. A censura, já amplamente divulgada e criticada, sinalizou, de modo direto e explícito, a violação de direitos de cada uma das mulheres protagonistas da campanha, das prostitutas em geral e, no nosso entendimento, de toda a sociedade brasileira.Ao longo dos 25 anos de enfrentamento da epidemia no Brasil, a ABIA vem desenvolvendo uma série de pesquisas e intervenções junto a diferentes grupos populacionais. O que temos observado a partir disso é que situações de preconceito, discriminação e violência que incidem sobre as vidas de pessoas que, pelo seu trabalho, identidade de gênero ou orientação sexual são excluídas de espaços que deveriam lhes assegurar acesso à saúde, educação, direitos trabalhistas, entre outros, podem trazer sérias implicações no manejo individual e coletivo de proteção frente ao HIV/AIDS. Ao ceder a posições moralistas e conservadoras em detrimento de inúmeras referências científicas acumuladas pela produção nacional e internacional no campo - postura observada com frequência a partir de medidas de censura  acerca dos direitos sexuais e suas relações com o enfrentamento da epidemia de AIDS (leia mais no blog Viomundo) -, o Ministério da Saúde contribui diretamente para o aumento de fatores negativos que marginalizam determinados grupos populacionais. Esta prática, por conseguinte, coloca estes grupos como categorias distintas daquelas que merecem ser consideradas como humanas, logo, sujeitos de direitos humanos, na medida em que se reconhece somente parte de sua existência e negam-se suas escolhas. Esta fragmentação do sujeito, no entanto, não combina com a atenção integral em saúde proposta pelas diretrizes de políticas públicas na área e a partir da implementação do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil.Em um país com elevados taxas de desigualdade social como é o caso do Brasil, as vulnerabilidades e as violências estruturais se sobrepõem e se multiplicam, gerando um contexto desafiador, no qual a combinação entre afirmação de direitos e políticas públicas de saúde deveria cada vez mais ser real, o que exige, por sua vez, ação política e participação social.No episódio recente do Dia Internacional das Prostitutas, direitos básicos de participação da sociedade civil na formulação de estratégias de prevenção foram violados. Além disso, permitiu-se brechas para que grupos que atuam contra a prática profissional das prostitutas se sintam confortáveis em expressar seus atos de ódio e violência.Evidencia-se, neste contexto, um fato de violação explícita do direito humano à saúde, conquistado e legitimado pelo Estado brasileiro. Neste sentido, a sociedade civil cobra um posicionamento por parte de instâncias governamentais defensoras dos direitos humanos em geral e, em particular, do direito das mulheres. Uma petição dirigida à Ministra-Chefe da Secretaria de Direitos Humanos e à Ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República solicita que ambas se posicionem, a partir de suas pastas, e retomem a proposta de veiculação da campanha como uma expressão do direitos fundamentais.A ABIA, assim como um conjunto de organizações da sociedade civil, ONGs, profissionais de saúde e universidades que integra o movimento social de AIDS no Brasil, expressa sua indignação e sua preocupação frente ao direcionamento conservador da política de enfrentamento ao HIV/AIDS assumido pelo atual governo. A tendência estigmatizadora e restritiva assumida pelo Ministério da Saúde em 2013 reflete um retrocesso já observado nos últimos anos. Os resultados positivos da resposta brasileira ao HIV/AIDS estão fortemente ameaçados. Ativistas e pesquisadores/as internacionais voltam seus olhares  para o cenário brasileiro, não mais em busca de inspirações e aprendizagens, mas estarrecidos/as e preocupados/as com o caminho de subjugação do governo aos interesses religiosos e, sobretudo, particulares.Fonte: ABIA 

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